Dos 80 parlamentares que assumiram o mandato pelo estado este ano, 36 têm laços familiares com políticos. Oito famílias estão representadas ao mesmo tempo na Câmara e na Assembleia Legislativa. Saiba quem são eles
A poderosa família Tatto tem Jilmar na Câmara federal e irmãos na Assembleia e na Câmara municipal de São Paulo |
A tradição de fazer política em família não é exclusividade dos estados mais pobres do país. A prática também se reproduz no estado mais rico da federação. Quase metade da bancada paulista tem laços familiares com outros políticos. Dos 80 parlamentares que assumiram o mandato por São Paulo, 36 têm algum parentesco com figuras políticas. O número é maior, por exemplo, do que toda a representação gaúcha no Congresso, composta por 35 congressistas. Os laços familiares na política se mostram mais extensos nas duas legendas que ocupam maior número de cadeiras dentro da bancada, o PSDB e o PT. Dos 18 tucanos paulistas que passaram pelo Parlamento este ano, dez são parentes ou cônjuges de políticos. Isso também ocorre com oito dos 17 petistas de São Paulo.
Atualmente, oito famílias acumulam representantes na Câmara dos Deputados e na Assembleia Legislativa de São Paulo. Duas delas exercem influência ainda maior e ocupam cadeiras nos três níveis do Legislativo (ou seja, também na Câmara de vereadores de São Paulo) : os Tatto e os Leite. Os dados fazem parte de levantamento exclusivo do Congresso em Foco, publicado desde segunda-feira (4), sobre as relações de parentesco político dos congressistas brasileiros.
Lá e cá
O deputado Jilmar Tatto (PT-SP) é irmão do vereador da capital paulista Arselino Tatto (PT-SP) e do deputado estadual Ênio Tatto, líder do PT na Assembleia. Prestes a completar 22 anos, o deputado Alexandre Leite (DEM-SP) é filho do vereador paulistano Milton Leite (DEM) e irmão do deputado estadual Milton Leite Filho (DEM-SP), de 32 anos. Assim como Jilmar Tatto e Alexandre Leite, outros seis deputados federais têm parentes na Assembleia. O deputado José Mentor (PT-SP) é irmão de Antônio Mentor (PT). Outros três federais são pais de estaduais: Vinícius Camarinha (PSB) é filho de Abelardo Camarinha (PSB); Rodrigo Moraes (PSC) é herdeiro direto do Missionário José Olímpio (PP-SP), e Cauê Macris (PSDB) descende de Vanderlei Macris (PSDB-SP). Em outros dois casos, o parentesco não é sanguineo, mas por afinidade: Jefferson Campos (DEM-SP) é cunhado do deputado estadual Carlos César (PSC), e Alberto Mourão (PSDB-SP) é sogro de Cássio Navarro (PSDB). Ao todo, cinco deputados paulistas exercem cargos que já foram exercidos por seus pais. Terceira mais votada na bancada nas últimas eleições, Bruna Furlan (PSDB-SP), de 27 anos, é filha do ex-deputado Rubens Furlan. Outro novato, Ricardo Izar (PV-SP) carrega o mesmo nome parlamentar do pai, morto há quase três anos. Em seu segundo mandato federal , estão Aline Correa (PP-SP), filha do ex-deputado Pedro Correa (PP-PE), cassado por envolvimento com o mensalão, e Carlos Zarattini (PT-SP), filho do ex-deputado Ricardo Zarattini (PT-SP). O mais experiente desse grupo de herdeiros políticos é Beto Mansur (PP-SP), que está em sua quarta legislatura. Beto é filho do ex-deputado Paulo Jorge Mansur.
Política “pulverizada”
A forma como as famílias paulistas alastram-se na política não parece diferir muito do que acontece em estados nordestinos, mostrados durante a semana pelo Congresso em Foco. Mas os deputados paulistas tentam buscar explicações não oligárquicas para as suas relações de parentesco. Argumentam que o modo de fazer política em São Paulo difere de outros estados, onde a tradição familiar é mais forte. Na avaliação de deputados ouvidos pelo site, a extensão do território e a diversidade da economia estadual fazem com que a política seja mais “pulverizada” em relação a unidades da federação menos populosas e mais pobres.
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“Não é uma coisa da natureza de São Paulo querer consolidar a presença de políticos. Tem alguns casos isolados. Mas não acho que seja uma dinâmica, como se tem no Norte ou no Nordeste. Em São Paulo, não há uma tradição de famílias”, defende Vanderlei Macris .Mas Vanderlei acaba admitindo que sua ação política ajudou a eleição de seu filho, Cauê Macris, para a Assembleia Legislativa. Embora insista que o que determinou a eleição do jovem de 28 anos, ex-vereador e presidente da Câmara Municipal de Americana (SP), foi sua própria trajetória política. “Meu filho era militante desde a época do Tucaninho (movimento do PSDB para estimular vocações políticas entre crianças). Com 16 e 17 anos, entrou na juventude do PSDB. E foi com esse estímulo que decidiu disputar uma vaga na Câmara de Americana (SP), sendo um dos mais votados da cidade. Foi presidente da Câmara e lá fez um trabalho muito interessante. Então, ele foi criando espaço próprio. Ele tem uma dinâmica política própria”, conta.
Lideranças formadas
Irmão do vereador paulistano Roberto Tripoli, o deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP) também insiste que as relações de parentesco em São Paulo não formam um modelo oligárquico. “Em São Paulo, você não tem essa questão antiga das oligarquias. Você não tem mais aqueles que dominavam a economia do país pelo estado de São Paulo, que interferiam na questão política. Acho que em São Paulo existem lideranças políticas que se foram se formando ao longo do tempo. No caso do meu partido, lideranças criadas sob a ética de grandes lideranças como Mário Covas, Fernando Henrique, Franco Montoro. Há um campo novo de atuação”, diz.
O deputado conta que ele e o irmão entraram para a política a partir do movimento estudantil. Os dois irmãos têm a imagem associada à defesa do meio ambiente e da sustentabilidade. “O nosso nome é identificado com a bandeira ambiental. Mas cada um tem o seu tipo de atuação. O envolvimento partidário dele, por exemplo, é um e o meu é outro. Nisso não confundimos os mandatos”, afirma. Ricardo Tripoli diz que ele e o irmão entraram para a política apesar dos apelos em sentido contrário do pai, Ricardo de Alvarenga Tripoli. “Meu pai, que já tinha sido secretário do Turismo da cidade de São Paulo, dizia que essa função de ser político era muito ingrata, porque a gente teria muitos dissabores na vida, muitas dificuldades. Então, acho que isso se tornou um desafio, tanto para mim, quanto para o Roberto. Acho que esse estímulo do meu pai foi meio inverso. E, depois que nos elegemos, ele se tornou um grande colaborador nosso”, conta.
Vocação
O deputado diz que não há uma justificativa para o fato de mais da metade da bancada tucana de São Paulo ter parentes na política. “Acho que não tem nenhuma correlação. Se fosse uma questão familiar, por exemplo, eu tenho outros dois irmãos que poderiam estar na política, mas um é da área de comunicação e o outro empresário. São Paulo é um pouco diferente essa relação, a escolha política vai muito da vocação da pessoa”, avalia. O cientista político Leôncio Martins Rodrigues levanta a “hipótese” de que a predominância de tucanos e petistas na “bancada dos parentes” em São Paulo tem relação com a possibilidade uma rápida ascensão social pela política. “A impressão que tenho é que os deputados dos partidos de centro e esquerda (como o PSDB ou o PT) tendem a ter mais parentes na política. Uma hipótese é de que a atividade política profissional atrai mais os políticos que estão vindo das classes médias assalariadas porque cargos oriundos da política possibilitam uma ascensão social e econômica rápida. Mas isso é uma hipótese”, pondera o professor da Universidade de Campinas (Unicamp).
“Profissionais”
Para ele, quem vem de família com tradição política costuma ser mais preparado do que seus colegas que nasceram em outro ambiente. “Os que nascem em famílias de políticos, só por esse simples fato, já estão melhor preparados para a vida política. Se familiarizam desde cedo com os fatos da vida pública. Além disso, podem contar com os ‘apoios’ construídos pelos mais velhos que já estão na política”, afirma. O nome familiar ao eleitorado e a existência de uma máquina eleitoral já azeitada, com cabos eleitorais e aliados, também favorecem os herdeiros políticos. “Se examinarmos a biografia de um Aécio ou ACM Neto, vemos que eles começaram a ser preparados para a política muito cedo trabalhando nos gabinetes dos avós”, considera. Na avaliação do professor, a atividade política nas democracias deve ser vista como uma “profissão”. “Os políticos profissionais, que vivem para a política e da política, não gostam de serem considerados como profissionais da política. Preferem ser considerados ‘representantes do povo’. Mas o fato de serem classificados como profissionais da política não é necessariamente pejorativo. Nada indica que os amadores seriam melhores”, considera. Para Leôncio, é melhor que os políticos sejam realmente profissionais. “Na verdade, não há outro jeito de as democracias funcionarem a não ser por meio dos políticos. Para meu gosto, é melhor os políticos profissionais, que devem ser eleitos, do que generais, iatolás, secretários-gerais ou ex-comandantes guerrilheiros”, declara o cientista político.
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