Cartolas e torcedores dos grandes de São Paulo têm por hábito exaltar
cada taça que seus rivais não possuem. Mas o tetracampeonato estadual,
mais rara conquista no Campeonato Paulista, é até agora exclusividade de
um clube que abandonou o futebol há décadas, quer distância de qualquer
aglomeração característica dos estádios e cujos associados dão de
ombros ao feito que nem o Santos de Pelé foi capaz de alcançar. “Eles (sócios) não têm a dimensão da magnitude que foram esses títulos.
A imprensa tem procurado muito mais as nossas taças e fotos do que os
sócios do clube. Ficou tudo muito esquecido. É uma pena”, afirma
a historiadora Ana Paula Fernandes, 24 anos, responsável pelo museu do
Paulistano, campeão paulista de 1916 a 1919. A exclusividade pode cair este ano, caso o Santos, agora liderado por
Neymar, vença o Corinthians na decisão. O primeiro jogo da final está
marcado este este domingo, às 16h (horário de Brasília), no Pacaembu. O Paulistano venceu 48 das 62 partidas que disputou naqueles quatro
anos, com seis empates e oito derrotas. Um aproveitamento de 82,26% (à
época, vitória valia dois pontos). Um time que marcou 211 gols e sofreu
67. Paulistano, o único tetracampeão Paulista da história. Equipe
campeã de 1916. Em pé: 1º Orlando Pereira, 2º Cunha Bueno, 3º Manoel
Carlos Aranha (Carlito). Agachados: 1º Sérgio Pereira, 2º Rubens de
Moraes Salles, 3º Benedito Ferreira (Basilicão). Sentados: 1º Agnello
Bastos, 2º Mário Andrada e Silva, 3º Mariano Procópio, 4º Madureira , 5º
Maurício Villela. Centro Pró-Memória do Paulistano. Poderia ser chamado de o time de Arthur Friedenreich – o maior jogador
brasileiro do início do século passado – mas era mais do que isso. Mesmo
porque o grande jogador somente se incorporou ao esquadrão em 1918,
quando foi artilheiro com 25 gols. “O Paulistano foi o grande campeão em uma época em que o futebol se
fortalece como o esporte mais popular do país, basta lembrar que há
relatos de 40 mil pessoas assistindo aos jogos decisivos em 1919 e que
aparecem as primeiras grandes rivalidades com o Trio de Ferro –
Paulistano, Palestra Itália, hoje Palmeiras, e Corinthians – e que o
futebol paulista é reconhecidamente o mais forte do Brasil”, diz o
jornalista Luiz Carlos Duarte, autor do livro “Friedenreich, a saga de
um craque nos primeiro tempos do futebol brasileiro”. Em 1916, o vice campeão foi o São Bento. Em 1917, o Palestra Itália. Em
1918, o vice-campeão foi o Corinthians, em uma competição marcada por
uma tragédia e a primeira grande polêmica envolvendo grandes times de
São Paulo. Houve a epidemia de gripe espanhola que, segundo dados oficiais, matou
2756 pessoas em São Paulo. Por isso, alguns jogos – que não
influenciavam na classificação final – foram cancelados. E o Palestra
reclamou muito após uma derrota por 3 a 1 para o Paulistano. Seus
dirigentes argumentaram que o árbitro não marcou três pênaltis contra o
rival e que seus jogadores eram vítimas de ofensas raciais por parte dos
adversários, que os chamavam de “carcamanos e italianada”. Abandonaram o
campo e o campeonato. Em 1919, o campeonato, emocionante, foi decidido na última rodada. O
Palestra dominou a competição desde o início. No primeiro turno, empatou
apenas um jogo, contra o Paulistano. No segundo, perdeu para o Ypiranga
por 6 a 1, em jogo que seus jogadores ficaram muito abalados com uma
contusão grave do jogador Bertolini, que deixou o campo ensangüentado,
diretamente para o hospital. Não havia substituição. O Paulistano foi reagindo e aproveitou-se de uma derrota do Palestra
para o Corinthians e chegou na penúltima rodada com chances de ser
campeão. Venceu o Palestra por 2 a 1, de virada, e assumiu a liderança.
Na última rodada, o Paulistano venceu o Corinthians por 4 a 1 com dois
gols de Friedenreich, um de Zito e outro de Agnelo. No Paulistano, Friedenreich teve um grande parceiro: o atacante Mario
Andrada, artilheiro do campeonato de 1919, com 22 gols. O jornalista Max
Valentim, no livro “O Futebol e Sua Técnica", o definia como um dos
grandes dribladores da época, ao lado de Neco, do Corinthians. Mario Andrada nunca foi da seleção brasileira. O Paulistano tinha dois
titulares no time de 1919, que conquistou o Campeonato Sul-americano,
primeiro título internacional do Brasil: o médio Sérgio Pires e
Friedenreich.As escalações do Paulistano são ditas com uma facilidade incrível por
Ana Paula Fernandes. Ela mostra fotos e recita nomes como se tivesse
vivido as grandes glórias do clube. “Não conheço muito sobre futebol mas
me dediquei muito a esse trabalho aqui. Vejo uma foto, comparo com
outra de anos depois e vejo se é o mesmo jogador. É preciso ter muito
cuidado para fazer as legendas corretamente. Sou são-paulina, não sei a
escalação do São Paulo de hoje, mas do Paulistano eu sei muita coisa”,
afirma ela sobre o clube que, hoje, é um símbolo da elite da cidade. EQUIPE CAMPEÃ EM 1916.
Em pé: 1º Orlando Pereira, 2º Cunha Bueno, 3º Manoel Carlos Aranha
(Carlito). Agachados: 1º Sérgio Pereira, 2º Rubens de Moraes Salles, 3º
Benedito Ferreira (Basilicão). Sentados: 1º Agnello Bastos, 2º Mário
Andrada e Silva, 3º Mariano Procópio, 4º Madureira , 5º Maurício Villela.
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