O país, apesar de vigoroso e sólido, vive complexas e profundas contradições desde sua fundação, em 14 de maio de 1948.
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O aeroporto Ben-Gurion, principal porta de entrada para Israel, fica
encravado no meio do caminho entre Jerusalém e Tel Aviv. Uma
auto-estrada ampla, de quatro pistas, asfaltada com requinte, conduz os
recém-chegados para qualquer um dos lados. A leste, para quem se destina
ao centro religioso do planeta. A oeste, para uma cidade mediterrânea e
cosmopolita.
Cena cotidiana à beira do mar em Tel
Aviv. Economia da cidade israelense cresceu, na última década, a um
ritmo médio de 3,4%/ano. Quase dez anos após a onda de ataques executados por homens-bombas, o
ambiente da principal cidade judaica do mundo pouco faz lembrar um dos
mais longos e tensos conflitos do pós-guerra. Ou de que se está em um
Estado confessional, no qual a religião desempenha função primordial de
identidade e regulação da vida privada. Leia também:
Sionismo, apesar das divisões, permanece como doutrina oficial Judeus e palestinos confrontam narrativas sobre independência. Novos edifícios, vários de alto luxo, nascem como espigões no chão de
Tel Aviv, a maioria destinada a estrangeiros, especialmente judeus
ricos, que buscam um rincão da terra prometida, mas de frente para o
mar. Bulevares arborizados recortam movimentadas avenidas e servem de
passarela para observar o quase onipresente acervo arquitetônico de
estilo Bauhaus. O branco toma conta da paisagem. Restaurantes elegantes e
bem decorados parecem sempre cheios. Moças de vestido curto e shorts, rapazes de calças jeans ou bermudas,
aproveitando o tempo quente e seco da primavera, inundam as ruas
centrais. Raramente se encontra um rabino ou sequer alguém usando quipá.
Salpicam alguns recantos históricos, como os mercados a céu aberto ou a
cidade árabe de Jaffo, incorporada como distrito depois de 1948. Mas
Tel Aviv, com região metropolitana superior a três milhões de
habitantes, exala um hálito de modernidade.
Jovem soldado israelense em Tel Aviv, cidade mais cosmopolita do país, caracterizada por seus arranha-céus e amplos bulevares. O município é a locomotiva de uma economia que cresceu, na última
década, a um ritmo médio de 3,4% ao ano, apesar da crise internacional
que abalou os Estados Unidos e a Europa a partir de 2008. Israel passou a
receber crescentes investimentos diretos em suas plantas industriais. As principais empresas dessa escalada produtiva são companhias de alta
tecnologia, concentradas em informática, equipamentos militares e
produtos farmacêuticos. As chamadas hi-tech respondem por quase 50% das
exportações do país. Instaladas majoritariamente no cinturão periférico
de Tel Aviv, viraram a meca das pessoas que se formam nas universidades e
sonham em fazer seu pé-de-meia. Leia mais:
China tenta aumentar protagonismo no Oriente Médio ao receber Abbas e Nethanyahu.
Stephen Hawking boicota Conferência Acadêmica israelense.
Netanyahu se reuniará com Putin para discutir fornecimento de armas à Síria.
China tenta aumentar protagonismo no Oriente Médio ao receber Abbas e Nethanyahu.
Stephen Hawking boicota Conferência Acadêmica israelense.
Netanyahu se reuniará com Putin para discutir fornecimento de armas à Síria.
Ao atrativo da pujança econômica, somou-se o reforço das condições de
segurança, depois que os territórios palestinos ocupados foram
fisicamente isolados. As contas externas também são beneficiadas por
recursos destinados a Autoridade Palestina passarem obrigatoriamente
pelo Banco Central israelense, onde dólares e euros são convertidos em
schekels. As reservas cresceram aceleradamente, valorizando a moeda
nacional e criando oportunidades para empresários locais expandirem suas
atividades no exterior.
Custo social:
Esse dinamismo, contudo, teve pesado custo social. Além das despesas
com as forças armadas representarem cerca de 30% do orçamento nacional,
esse item também sobrecarrega as importações, provocando saldos
negativos na balança comercial. Mesmo com os EUA arcando, a fundo
perdido, com 20% dos gastos em segurança (aproximadamente 3,5 bilhões de
dólares anuais), Israel só sai do vermelho atraindo novos capitais.
Atualmente 23,9% dos israelenses vivem com menos de 27 dólares diários, apesar da taxa de desemprego estar em 6,3%. Enormes subsídios e isenções fiscais são concedidos, com esse
propósito, para o mundo dos negócios. A contrapartida, para combater o
déficit interno, é uma forte redução das verbas alocadas em programas
sociais e serviços públicos, agravada pela desregulamentação de direitos
trabalhistas. A economia cresce, mas a riqueza se concentra e a pobreza
se expande. O número de pessoas cuja renda é inferior a 40% do salário médio subiu,
desde 2003, de 7,8 para 12,1%. Abaixo de 50%, de 15 para 19,8%. Se o
corte for de 60%, de 23,3 para 26,8%. Os dados são da OCDE (Organização
para Cooperação Econômica e Desenvolvimento). Há 15 anos, 16% dos
israelenses viviam abaixo da linha da pobreza, segundo relatório do
Instituto Nacional de Seguros, órgão governamental. Atualmente 23,9% dos
cidadãos vivem com menos de 27 dólares diários, apesar da taxa de
desemprego estar em 6,3%. A onda de protestos que varreu Tel Aviv e outras cidades, em 2011, foi
uma resposta a essa situação. Mais de 500 mil pessoas participaram de
protestos, cuja reivindicação principal era a redução dos aluguéis e do
preço das moradias. A renda média dos israelenses dificilmente suporta o
custo habitacional, em um mercado imobiliário que se voltou para o
topo da pirâmide.
Cerca étnica:
O muro social vai ficando cada vez mais alto, mas ainda não compete com
a cerca étnica. Os árabes-israelenses representam cerca de 22% da
população nacional, de 7,5 milhões. O salário médio entre esse grupo, de
1,5 mil dólares mensais, é 32% inferior ao de trabalhadores judeus.
Mais de 53% das famílias palestinas vivem na pobreza, entre as quais o
desemprego passa dos 10%. Das 40 cidades israelenses com maior
quantidade de moradores sem trabalho, 36 são de maioria árabe. Nos territórios ocupados da Cisjordânia e Jerusalém Oriental as cifras
são ainda mais severas, ainda que as estatísticas sejam inexatas ou
contraditórias. O problema se agrava, contudo, porque essas populações
não possuem sequer direitos civis e eleitorais. Essas áreas foram
isoladas por um sistema de muralhas e alambrados, sob a justificativa de
deter a onda de atentados em solo israelense.
Muro da Cisjordânia, ou "muro do apartheid" para os palestinos, construído pelo Estado de Israel por questões de segurança. Aparentemente esse objetivo foi alcançado, apesar do lançamento de
mísseis provenientes da Faixa de Gaza continuar desafiando a segurança
do país. Mas o custo econômico e social para os palestinos é estrondoso.
Não podem mais buscar empregos nas fronteiras oficiais do Estado
sionista. Sua mobilidade está fortemente limitada. As perdas de
propriedades e plantios são expressivas. Esse cenário estabeleceu uma parede entre Israel e a comunidade
internacional. As Nações Unidas consideram ilegais tanto a ocupação
destes territórios quanto o sistema de segregação espacial. Resoluções
recentes também condenam o processo de colonização judaica dessas áreas,
que deveriam pertencer ao Estado palestino. Assentamentos na
Cisjordânia são oficialmente estimulados, recebem subsídios e têm sua
guarda garantida pelo exército, além de serem encapsulados pelo muro da
separação. Alguns intelectuais e líderes sionistas mais à esquerda passaram a
declarar, nos últimos anos, que Israel estava perigosamente caminhando
para um modelo inspirado pelo apartheid sul-africano, por conta da
estratégia que conduz em relação à questão palestina. As correntes mais à
direita, atualmente no governo, rejeitam a comparação e afirmam que as
medidas respondem apenas às necessidades de combate ao terror. Os críticos desse ponto de vista afirmam que a solução para a paz não
está no erguimento de muros, mas na negociação de um acordo permanente
para a existência de um Estado palestino viável e autônomo. A maioria
das lideranças relevantes, incluindo o primeiro-ministro Benjamin
Netanyahu, discursa a favor dessa saída. Mas há muitas dúvidas se alguns
dos protagonistas não estão apostando em fazer, do transitório, uma
eternidade. O fato é que Israel chega aos 65 anos de sua independência, celebrados
nesse 14 de maio, como uma nação vigorosa e sólida, mas espetada por
contradições. Exibe vitalidade econômica e poderio tecnológico. Vive,
contudo, os conflitos de um sistema que produz desigualdade social,
discriminação étnica e tentação colonial. Para que o leitor possa conhecer um pouco mais desse país e seus dilemas, Opera Mundi inicia hoje a publicação de reportagem especial sobre Israel.
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