sexta-feira, 9 de maio de 2014

HISTÓRIA & ESTÓRIAS - O SÓSIA DO PISTOLEIRO LUQUINHA - Por LACY CARVALHO

O conterrâneo “Dadá de João Olímpio” media 1,50 m de altura, pesava 50 kg, tinha o corpo muito franzino, mas um narigão que dava pra duas pessoas do tamanho dele. Dadá era metido a valente. Procurava briga com todo mundo. Mas nunca lesionou ninguém. Só levava muita peia. Filho caçula da família.  Ficou órfão no dia que nasceu. Na hora que Belinha Parteira conseguiu sacá-lo, pediu a Seu João Olímpio para acender a vela (Nos trabalhos de parto lá no bairro do Rosário, por precaução, a vela e a caixa de fósforos já ficavam apostos). A finada Francisca não chegou nem a ouvir o choro do bebê porque morreu segundos antes daquelas tradicionais tapinhas na bunda. A família morava distante da cidade uns 3 km. Todo fim de semana Dadá selava o cavalo e vinha pra rua só beber cachaça. Na festa de Senhor do Bonfim de Icó, no dia 1º de janeiro de 1968, um paraibano da cidade de Aguiar - Vale do Piancó - ficou estarrecido com a semelhança física entre "Dadá de João Olímpio" e o famoso pistoleiro "Luquinha da Paraíba". Luquinha era muito temido na nossa região porque muitos crimes de pistolagens, acontecidos no Vale do Jaguaribe, eram atribuídos a ele. As proezas de Luquinha da Paraíba chegaram a ser publicadas em cordéis. O nome dele era muito badalado. Os mais idosos diziam que Luquinha tinha o corpo fechado. Bala e peixeira não penetravam nas veias sanguíneas dele; Comentava-se que Luquinha quando recebia a foto de uma futura vítima, dizia ao contratante do serviço: “Eu já estou com ódio desse sujeito”. A mãe de Luquinha era feiticeira e tinha poderes sobrenaturais. Ela benzia os revólveres, as balas e ficava rezando no exato momento em que ele estava efetuando os disparos (Vale lembrar que nesse tempo não existia telefone celular moderno como os que Fernandinho Beiramar utiliza hoje em dia); Ela falava para os quatro cantos do mundo ouvir: “Enquanto eu viver polícia nenhuma prenderá Luquinha...” As histórias sobre Luquinha eram impressionantes. Quando Manoel Guabiraba ficava contando, gesticulando, mostrando a gente as posições que Luquinha atirava, montado no cavalo, com um revólver em cada mão, todo mundo ouvia atento, de boca aberta. Eram dois disparos simultâneos. E às vezes um tiro na vítima que estava na frente e outro no segurança que estava por atrás. E o principal: Depois do serviço feito Luquinha se “invultava”. Desaparecia misteriosamente do local do crime transformado em pequenos animais domésticos. Todos esses sincretismos giravam em torno do nome desse marginal. Quando a polícia tinha informações de que Luquinha tinha fugido para o lado do Norte, todas as diligências policiais seguiam no rumo da região Sul. Eu, ainda adolescente, ouvi e aprendi tantas histórias de Luquinha que ele se tornou um dos meus ídolos.  Eu tinha a maior curiosidade de conhecê-lo pessoalmente.  A primeira vez que eu fui fazer seresta na Cidade de Aguiar, em 1989, saí nas ruas perguntando ao povo sobre Luquinha. Fui informado de que ele morava num Sítio distante 3 km da sede do Município. Só desisti de conhecê-lo porque me falaram que ele estava débil mental, e que era muito perigoso, porque embora idoso (quase aos 70 anos, na época) ele ainda era violento e permanecia com aquela idéia fixa de matador. Tinha sentido essa preocupação das pessoas da cidade. Alguns anos mais tarde ele morreu esfaqueado por um cidadão que agiu em legítima defesa. Mistérios e sincretismos à parte, o que é verdade é que Luquinha viveu mais de 80 anos, praticou mais de 100 assassinatos e jamais passou um dia na prisão.Pois bem, meus amigos, o aguiaense viu Dadá apeando do cavalo em frente a barraca de Francinete Laurentino, próxima a Igreja, chegou perto dele assustado e perguntou: “Luquinha, que diabo tu veio fazer no Icó, Luquinha? Tu tá ficando doido? Aqui é boca quente, homem.  Se tu veio fazer algum serviço aqui arregale bem os olhos, se não tu vai se lascar”. Dadá estava meio embriagado. Surpreso, ele estranhou aquela preocupação do cidadão. Mas dialogando descobriu que estava na verdade sendo confundido com o pistoleiro Luquinha da Paraíba. 20 dias se passaram.  E na festa de São Sebastião do Distrito de Lima Campos, depois de encher a pança de cervejas e desfrutar das comidas da peixada de “Zé da Barragem”, acompanhado por uma moça que ele tinha trazido da Rua da Palha, na hora de pagar a conta, sem uma prata no bolso, Dadá perguntou a Zé se ele já tinha ouvido falar em Luquinha da Paraíba. Zé respondeu: “Já ouvi sim, Senhor.” Dadá deu meia volta, colocou o pé no estribo do cavalo, montou, ordenou que a quenga pulasse na garupa, e disse: “Pois muito prazer. Você está falando com Luquinha da Paraíba em carne e osso”. O coitado de Zé da Barragem tinha ingerido uma xícara de chá de quebra-pedra (Remédio caseiro para doenças dos rins), quando ouviu essa prosa deu uma mijada que fez biqueira nas pernas da bermuda. Perdeu a fala por alguns minutos. E quando entrou em órbita disse: “Seu Luquinha a casa aqui é sua. Faça o que quiser.” Deu tudo certo. Dadá sentiu firmeza e foi fazendo o mesmo nos outros bares e peixadas do lugarejo. Por algumas horas ele causou terror. A curiosidade do povo era para descobrir quem seria o candidato a defunto (Comentava-se que Luquinha não perdia viagem. Algumas vítimas ele conduzia na garupa do cavalo para prestar contas com o mandante). A tradicional festa de São Sebastião poderia se acabar a qualquer momento, com intenso tiroteio. A felicidade foi que Anselmo Camelô, de Icozinho, estava vendendo a banha do peixe boi na calçada da Igreja e ficou intrigado ao perceber que os seus fregueses estavam fugindo assustados. Observou aquela movimentação. Viu quando umas velhinhas se benzeram ao cruzar com Dadá montado naquele cavalo. Anselmo entrou em cena, descobriu a farsa, e anunciou: “Que conversa de Luquinha da Paraíba. Esse cu de cana é Dadá de João Olímpio, lá do Sitio Carro-Quebrado, de Icó.” Meus amigos, os comerciantes se organizaram, derrubaram Dadá, tomaram o cavalo, deram uma surra nele daquelas que se dá em gente grande.  Naquela dimensão que deixa o caboclo mais moído do que Judas na semana santa. O miserável só escapou porque quando Zé da Barragem lhe acertou uma paulada no lombo ele caiu emborcado no buraco do esgoto, e se fingiu de morto. Foi a estréia e também a última vez que Dadá se impostou de “Luquinha da Paraíba”. Nota de Saudade: Meu amigo, meu conterrâneo, meu ex-colega de trabalho na oficina do saudoso mestre Assis fèlix, grande contador de piadas e de causos "Manoel Guabiraba” me informou que “Dadá de João Olímpio” faleceu recentemente. Só agora fiquei sabendo. Que Deus o tenha num bom lugar.
Extraído do Livro, Histórias, Estórias, Crônicas e "causos". De João Dino.

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