Canibalismo, suportar por meses temperaturas de até -30º C sem roupas
apropriadas ou esperança de resgate são alguns dos elementos da história
conhecida como o ‘Milagre dos Andes’, que continua fascinando o mundo
após 40 anos, lembrados neste sábado, com a presença, em Santiago do
Chile, dos 16 sobreviventes, alguns deles jogadores de um time de rúgbi
uruguaio. O impacto de sobreviver ao famoso desastre acidente aéreo sobre a
Cordilheira dos Andes inspirou nada menos que 13 deles a compartilhar a
experiência em palestras motivacionais, nas quais mostram que sua
experiência de ultrapassar os limites físicos e mesmo da lógica –
racionalmente as chances de sobrevivência sob condições tão adversas
pareciam mais um delírio do que um plano coerente – pode ser aplicada em
outras situações de vida (veja tabela abaixo). “Dizem que esta é história de sobrevivência mais importante da
humanidade, porque foi protagonizada por gente comum, não éramos
superdotados, preparados” disse Carlos Paez ao UOL Esporte. “Quando se vai escalar o Everest, por exemplo, são feitas preparações
para possíveis contratempos, mas não tínhamos nada disso. Nossa história
fascina, especialmente no exterior. No Uruguai já estão acostumados,
mas fora não. No ano passado por exemplo, eu fiz 102 palestras, em
países sul-americanos, de Brasil a México, mas também em várias outras
partes do Mundo”, explica ele. As palestras são encomendadas por empresas, muitas delas seguradoras,
para transmitir conceitos de superação e de que as pessoas devem estar
preparadas para o inesperado. O fascínio pela história pode ser explicado por alguns de seus
elementos: os sobreviventes foram obrigados a comer a carne de alguns de
seus companheiros mortos, além de terem suportado, graças a um
inteligente e solidário sistema de divisão de tarefas, mais de dois
meses em um dos ambientes mais inóspitos, sob temperaturas de dezenas de
graus negativos. Em 13 de outubro de 1972 Carlos era uma das 45 pessoas a bordo do voo
fretado Força Aérea Uruguaia 571 que transportava a equipe de rúgbi Old
Christians Club de Montevidéu para uma partida em Santiago do Chile. Devido ao mau tempo, o avião se chocou contra uma montanha da
Cordilheira dos Andes, na remota fronteira entre o Chile e a Argentina.
Morreram 18 pessoas imediatamente ou nos dias que se seguiram e os outros
não dispunham de alimentos, roupas ou remédios apropriados. A decisão de recorrer ao canibalismo não foi fácil. O sobrevivente Fernando Parrado conta em seu livro Milagre nos Andes que eles tentaram se alimentar até de tiras de couro rasgado de peças de bagagem antes de apelar ao canibalismo. Segundo Paez, decidir se alimentar dos companheiros mortos foi um dos
piores momentos que eles passaram nos 72 dias antes da volta para a
civilização, mas não o primeiro ou o mais terrível. O primeiro, foi o
acidente em si e o segundo, quando ouviram 10 dias depois, que as buscas
haviam sido abandonadas. “Este foi o momento em que mudamos nossa história. Foi quando tomamos
as rédeas de nossas vidas e, mesmo sentindo o desespero mais profundo,
tomamos a decisão de sobreviver. Nos conscientizamos de que não
poderíamos contar com ninguém e que teríamos que resolver sozinhos nosso
problema”, disse Paez. No entanto, as coisas iriam ainda piorar antes de melhorarem. Uma
avalanche soterrou todos por três dias. Mais oito pessoas morreram no
incidente. O grupo decidiu então mandar uma expedição buscar ajuda,
quando o tempo melhorasse. A contribuição vital de Paez foi costurar um saco de dormir improvisado
para que os dois escolhidos não morressem congelados. Após uma
caminhada de dez dias, eles encontraram ajuda. A história rodou o mundo e
virou filme. “Foi perigoso me tornar famoso aos 18 anos. Me entreguei ao álcool e
drogas, até perceber que havia sobrevivido a tudo aquilo e seria idiota
me entregar a um projeto de morte”, conta Paez. “O acidente não me deixou traumas, mas me tornou uma pessoa muito melhor.” Ele conta que embora os sobreviventes não sejam os amigos mais próximos
do mundo, o grupo se reúne de tempos em tempos . No aniversário de 30
anos, em 2002, eles disputaram uma breve partida de rúgbi contra o time
chileno dos Old Boys, jogo que não aconteceu por conta do desastre.
Sobreviventes dos Andes.
1972 |
O que fazia |
Hoje em dia |
O que faz |
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José Pedro Algorta Durán - Aos 21 anos, estudava economia. |
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Diretor de empresas, vive na Argentina e tem um blog no qual conta sua experiência de sobrevivência. |
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Roberto Jorge Canessa Urta - Tinha 19 anos e estudava medicina. |
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Cardiologista, dá palestras sobre sua experiência. |
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Alfredo Delgado - Aos 24 anos, estudava direito. |
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Funcionário público. |
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Daniel Fernandez - Tinha 26 anos e estudava agronomia. |
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Engenheiro agrônomo, é também empresário e faz palestras. |
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Roberto Fernando François Alvarez - Aos 20 anos, estudava agronomia. |
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É produtor agropecuário. |
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Roy Harley - Estudava engenharia mecânica aos 20 anos. |
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Engenheiro industrial. |
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José Nicolás Inciarte - Estudava agronomia, tinha 24 anos. |
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Engenheiro agrônomo, também dá palestras. |
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Alvaro Mangino Schmid - Jogava rúgbi em tempo integral, aos 19 anos. |
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Técnico agropecuário, também é empresário e palestrante. |
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Javier Alfredo Methol Abal - Tinha 36 anos. |
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É palestrante. |
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Carlos Miguel Paez Rodriguez - Aos 18 anos, estudava agronomia. |
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Técnico agropecuário, faz palestras. |
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Fernando Parrado - Estudava engenharia mecânica aos 21 anos. |
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Produtor de TV e palestrante. |
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Ramon Sabella - Estudava agronomia aos 21 anos de idade. |
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É empresário e palestrante. |
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Antonio Vintizin - Estudava direito aos 19 anos. |
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É empresário e palestrante. |
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Gustavo Zerbino - Estudava medicina, aos 19 anos. |
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Diretor de empresas e palestrante. |
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Eduardo Strauch - Estudava arquitetura, tinha 25 anos. |
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Tem um estúdio de arquitetura e faz palestras. |
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Adolfo Strauch - Aos 24 anos, estudava agronomia. |
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É produtor agropecuário e palestrante. |